O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) decidiu afastar a cobrança de Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) na integralização de capital social feita por sócios a uma holding familiar. Por unanimidade, os desembargadores da 2ª Câmara de Direito Público reconheceram que a operação, realizada pelo valor histórico dos bens, não gerou a incidência do tributo por não haver formação de reserva de capital.
No caso concreto, seis imóveis de uma mesma família foram transferidos para a empresa Saad Melo Investimentos e Participações, em Cuiabá, com base em valores históricos de R$ 1,8 milhão. A Prefeitura, no entanto, arbitrou a base de cálculo em R$ 3,6 milhões — valor de mercado à época — e cobrou R$ 37 mil de ITBI (equivalente a cerca de R$ 70 mil atualmente).
A decisão, assinada pelo juiz convocado Luis Otávio Pereira Marques, reformou sentença de primeiro grau e estabeleceu que, como não houve destinação de valor excedente à formação de reserva de capital, não se aplica ao caso a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 796. Esse precedente permite a cobrança do ITBI sobre valores que ultrapassem o capital social na integralização de bens imóveis em pessoa jurídica.
O magistrado ainda apontou que o município realizou a cobrança sem instaurar procedimento administrativo, o que viola princípios constitucionais como o contraditório e a ampla defesa, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Para o advogado Alex Ferreira, do FCS Advogados, que atuou no processo, a decisão é a primeira favorável nesse sentido no TJMT. “A jurisprudência até então aplicava o Tema 796 sem distinguir se havia ou não reserva de capital. Essa decisão fez essa diferenciação importante”, destacou.
A advogada Cindy Schossler Toyama, da mesma banca, reforçou que a integralização foi registrada pelo mesmo valor declarado no Imposto de Renda, sem qualquer ágio ou reserva. “É bem diferente de quando o contribuinte reconhece que o imóvel vale mais e lança como reserva de capital”, observou.
Especialistas apontam que o julgamento evidencia a insegurança jurídica gerada após a decisão do STF de 2020, que aflorou uma “saga arrecadatória” por parte dos municípios ao cobrarem ITBI sobre a diferença entre valor histórico e de mercado.
A Procuradoria-Geral do Município de Cuiabá informou, em nota, que respeita a decisão, mas avaliará recorrer ao STJ ou até ao STF. Segundo o órgão, a arrecadação do ITBI compõe o orçamento municipal e decisões contrárias comprometem a capacidade de investimento da prefeitura.
A discussão sobre o alcance da imunidade na integralização de bens segue gerando controvérsia no país. Uma recente decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, em caso semelhante, considerou a matéria infraconstitucional — o que pode transferir o debate definitivo para o STJ.
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